Saturday, February 7, 2009

O Espaço ou a Solidão (1) a profundidade da solidão


Estou só, só como ninguém ainda estêve
[Álvaro de Campos]

É bem conhecido, e nada mais me cabe do que lembrá-lo, que um dos pontos de reflexão das considerações de Fernando Pessoa é a solidão a que qualquer ser humano está votado, mas ele muito especialmente, ao multiplicar os raciocinos com que põe em questão as categorias do real e com que pensa e repensa a sua posição do homem triplamente solitário : perdido diante da infinidade cósmica, divorciado dos outros por se ter adiantado demais aos companheiros de viagem e afastado de si próprio por não encontrar a unidade que nem os deuses têm. (« Deus não tem unidade, Como a terei eu ? »)

Ao longo da vida e da obra, Pessoa, está obsessivamente só, mas é ele o criador da profundidade da sua solidão e, consequentemente, é também o criador do espaço da sua poesia. Poeta entregue à vastidão de água, céu ou terra e à imensidão indefinida da ‘beira-ser’ ou de um além onde « os poentes são », é, por paralelismo, o homem entregue ao espaço individual e incomensurável de um mundo do pensamento que vai crescendo em extensões indeterminadas e que vai sondando a grandeza da solidão que traz em si.

A imaginação cria-lhe extensões arrancadas ao seu mundo intimo e é daí que surgem os espaços abertos que Pessoa ortónimo e heterónimo nos faz percorrer ao longo da sua poética. O deserto, ou a floresta volvem-se nos em espaço interior e não são aqueles que sugerem este, mas é o apelo intimo da imensidade que vai fazer surgir a extensão e a distância.

[Maria da Glória Padrão, A metáfora em Fernando Pessoa, 1981]

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