Sunday, March 29, 2009

O Espaço ou a Solidão (11) Sem depois nem antes


Ele, que quis ser o continente de todas as forces em acção, define-se agora em desencontro no espaço – “Longe de mim em mim existo » – e em nada no tempo – « Oco dentro de mim sem depois nem antes ».

Aniquila-se Morre pela voz de Campos :

O horror súbito do entêrro que passa E tira a máscara a todas as esperanças. Ali … Ali vai a conclusão. Ali (…) Vai o nós!
(Campos, 522)

Morre pela voz dele mesmo porque o seu coração é um túmulo com epitáfio – “Fui eu a minha sepultura”.
Morre pela voz de falsa aceitação de Reis, aceitação de um destino inexorável :

Somos contos contando contos, nada.
(Reis, 413)

Dizer da insubsistência da vida pelas palavras de Pessoa-Reis, é o mesmo que fazer desaguar a existência no vácuo como o faz Pessoa-Campos – « Compreendi todo o vácuo da existência sem inteligência para o compreender » – ou inscrever os valores numa nova forma de espaço dado agora pela preposição « entre ». Esta palavra é muito do agrado do poeta e contrapõe-se ao outro tipo de indeterminação que ele objectiva, por exemplo, em palmares das Antilhas ou em « jardins maravilhosos nas ilhas in explicitias ». A diferença consiste, não na significação do conceito, mas unicamente em não haver qualquer forma de concretismo, desta vez.

Com este vocábulo, Pessoa leva-nos para uma esfera de irreal, deixa-nos agarrados à musicalidade do poema e a intuir o que será o « entre » sem lugar ; amargura-nos com jogos de palavras em que transparece a fragmentação e o aniquilamento da vida em três planos fundamentais : do sagrado, do social e do individual.

No plano do divino articula maliciosamente uma pergunta sem reposta, para chegar a uma negação – “Deus é um grande Intervalo / Mas entre quê e quê ?; no contacto de si com os outros, a mesma articulação de impossibilidade de convívio – « … esta vida / Que passo entre a impenetrabilidade física e psíquica / Da gente real com que vivo ! » No plano individual o uso da palavra tem uma carga de pessimismo ainda mais alta – o poeta não se sabe definir, só tem a percepção de que onde é não é e onde está não está. Não se apreende, existe separado, vive em paradoxo :

Entre o que vivo e a vida, Entre quem estou e sou, Durmo numa descida, Descida em que não vou.
(Cancioneiro, 158)

A personalidade que tem está « entre o corpo e a alma » (Campos 446) e a vida,

… é êste estar entre Êste quase, Êste poder ser que … Isto.
(Campos, 490)

que o transporta à angústia.

O « entre » é a irrealização, o vazio, o nada dos sonhos de Reis e do caixão de Campos; o “entre” é o local indefinido a concordar com a inexistância de coisas lindas nos mares de qualquer sul ou no ópio de qualquer oriente. É mais uma vez a solidão num mundo desarticulado em que as coisas são, independentemente umas das outras – « Grandes mágoas de todas as coisas serem bocados. »

De Bernardim a Camões, de Herculano a Soares de Passos, ou Nobre ou Sá-Carneiro a solidão é tema. Nomes diferentes e outros tantos modos de a sofrer. Pessoa, não é, portanto um solitário único. A transmissão do isolamento, seja ele ermitania ou abadondo por parte qo que lhe é exterior, é que é outra. Canta-a através de espaços abertos, fechados ou abstractos ; ajusta-se-lhe por contrato – « Minha mulher, a solidão – e sofre com ela na constante polémica interna que o mantém e que se extravasa em « Versos, versos, versos, versos, versos / Tantos versos … » para nos dizer que está « … só ; só como ninguém ainda esteve ».

[Maria da Glória Padrão, A Metáfora em Fernando Pessoa, 1981]

Saturday, March 28, 2009

O vicio e os Papas


"Pour manier les hommes, il faut pratiquer leurs vices et en rajouter. Voyez les papes : tant qu'ils forniquaient, s'adonnaient à l'inceste et assassinaient, ils dominaient le siècle ; et l'Église était toute-puissante. Depuis qu'ils en respectent les préceptes, ils ne font que déchoir : l'abstinence, comme la modération, leur aura été fatale ; devenus respectables, plus personne ne les craint. Crépuscule édifiant d'une institution."

[Emile Michel Cioran, Syllogismes de l'amertume]

Para reger os homens, tem de praticar seus vicios e acrescentar. Vê os Papas: quando ainda trepavam, entregavam-se ao incesto e assasinavam, dominavam o século; e a Igreja teve todo o poder. Desde que respeitem os preceptos, decepcionam completamente: o abstinencia, como o moderação sera-lhes fatal; tornado respectavel, mais ninguem teme-lhes. Crepusculo edificante duma institução."
[libre tradução de: Emile Michel Cioran, Syllogismes de l’amertume]

Wednesday, March 25, 2009

Espiritual



Não gosto da palavra ‘religiosa’. Gosto mais da palavra ‘espiritual’. Espiritual é o que em nós, não está satisfeito com o mundo, que não adapte-se ao nenhum mundo. Só quando murcha o espiritual que torne-se ‘religiosa’.

Certas palavras do Christo são, porém para mim, intolerável. Não posso aceitar-as. Refuso de aceitar-as, porque sei que tenho de abandonar demasiado. É por isso que reconheco a verdade dessas palavras, à que nelas não gosto de nenhum maneira.


tancredo infrasonic

O Espaço ou a Solidão (10) O conteúdo da mala


Por carácter, Fernando Pessoa também está só. A sua maneira de ser leva-o a uma falta de jeito para a convivência e reforça-lhe a solidão. Voltado para si, « intro-absorvido », chegando ao exagero de afirmar : « Amo-me por ter escrito « Ah, poder ser tu, sendo eu ! / Ter a tua alegre inconsciência / E a consciência disso »(CACR) e, por outro lado, conhecendo-se como homem de excepção, afirma que est´só :

« … e, dos que de perto literariamente me cercam, você sabe bem que (por superiores que sejam como artistas) como ALMAS, propriamente não contam … »
« Em ninguém que me cerca eu encontro uma atitude para com a vida que BATA CERTO com a minha intima sensibilidade, com as minhas aspirações e ambições, com tudo quanto constitui o fundamental e o essencial do meu intimo ser espiritual. Econtro, sim, quem esteja de acordo com actividades literárias que são apenos dos arredores da minha sinceridade ». (CACR)

Como se estas características não bastassem para determinarem uma espécie de solidão, acrescente-se ainda um retraimento natural que toca as raias da vergonha, um horror de se dar a conhecer, um sentido do secreto altamente acentuado que o levam a manter a inviolabilidade do seu território.

Em vários momentos da sua poética se patenteia a repugnância em se mostrar e até o Campos sensacionista que diz ser um universo, o complexo das coisas criadas, experimentadas e pensadas, assim se define :

Trago dentro do meu coração, Como num cofre que não se pode fechar de cheio, Todos os lugares onde estive, Todos os portos a que cheguei …
(Campos)

O sentido de camuflado parece abandonar a imagem que o poeta usa mas nela está realmente implícita a intimidade. O que é, afinal, esse conjunto de lugares ? É a vivência do poeta ou o que ele quer que seja essa vivência. É o seu ser, a sua interioridade desdobrada para o exterior, uma pretensa extroversão que vai até a um grau infinito de tempo e espaço. Por insuficiência de cálculo, não podemos apreender esse ponto de chegada loge, escapa-se nos o intimo do poeta. « Nous n’arrivons jamais au fond du coffret. Comment mieux dire l’infinité de la dimension intime ? » (Gaston Bachelard, La poétique de l’espace).

Também não é casualmente que a palavra « mala » passa de acidente de expressão a pensamento constante de determinada trajectória do Pessoa-Campos. O conteúdo psíquico desse vocábulo é revelador do segredo que o poeta quer guardar só para si. A mala pessoal é um espaço que não se franqueia a qualquer um, um espaço de intimidade, um ponto de convergência de interioridade, um esconderijo que é a própria vida :

Tenho que arrumar a mala de ser. Tenho que existir a arrumar malas.
(Campos, 478)

O nosso trabablho de penetração cessa se quisermos saber qual o contéúdo do cofre ou da mala e assim ele salvaguarda o seu mundo, que cerca de grandes muros.

Cessa também se quisermos saber como é a casa de infância. Pessoa nunca a descreve, porque dar conhecimento dos seus recantos intimos seria um pouco violar-se a si próprio.

Inviolável e só está o poeta sempre, não na formulação dos problemas mas na acuidade com que percepciona e indaga o que lhe é dado pensar.
A sua condenação sabe ele qual é :

Estou prêso ao meu pensamento Como o vento prêso ao ar.
(Cancioneiro, 134)

A pensar, o poeta perde-se na “dolorosa instabilidade e incompreensibilidade / Deste impossivel universo » e no labirinto que é, soterrado pelo mistério que sobre ele ruiu.

Se vislumbra uma razão de viver, já que Deus lhe deu a missão de ser poeta – « Há um poeta em mim que Deus me disse » - acabará por descobrir afinal que « há sempre escuro dentro dele ».

Se quer percepcionar qualquer reposta aos seus anseios e às suas exigências, todas as portas se lhe abrem para a dúvida, para o mistério, para a inconsequência de si próprio, para a morte. Por vezes nem se chegam a abrir – « Fecharam-me todas as portas abstractas e necessarias”.

Se quer aderir à “alucinação extraordinariamente nítida » que é a realidade, é vítima do processo de realização que para si escolhe :

… eu, em cuja alma se reflectem As forças tôdas do universo, (…) Eu sofro ser eu através disto tudo como ter sêde sem ser de água.
(Campos, 521)

[Maria da Glória Padrão, A Metáfora em Fernando Pessoa, 1981]

Friday, March 20, 2009

O Espaço ou a Solidão (9) ilusão e palco


A ignorância é, como vimos, uma das verdades que o poeta possui. Outra é a ilusão. O duplo jogo da verdade que observa na vida perturba-o e vincula mais fortemente a sua crença no erro do existente.

« Encontrei hoje em ruas, separadamente, dois amigos meus que se haviam zangado um com o outro. Cada um me contou a narrativa de por que se haviam zangado. Cada um me disse a verdade. Cada um me contou as suas razões. Ambos tinham razão. Ambos tinham tôda a razão. Não era que um via uma coisa e outro outra, ou que um via um lado das coisas e outro um lado diferente. Não: cada um via as coisas exactamente como se haviam passado, cada um as via com um critério idêntico ao do outro, mas cada um via uma coisa diferente, e cada um, portanto, tinha razão” (Obra Poética).

Que concluir daqui?

« Tudo é ilusão.
A ilusão do pensamento, a do sentimento, a da vontade. Tudo é criação é ilusão.
Criar é mentir.
Para pensar o não-ser criámo-lo, passa a ser uma coisa.
Todos os que pensam ocultistamente criam em absoluto todo um sistema do universo, que fica sendo real. Ainda que se contradigam: há vários sistemas do universo, todos eles reais.
Nós próprios, porque existimos, somos criações também, portanto ilusões. Mas somos criações de quem ? Do Deus que nós próprios criámos ? Como se o criámos nós, e lhe somos portanto anteriores ? Isso é supondo real o tempo, que é outra criação nossa. Tudo é um amontoado de ilusões.
Aquilo que chamamos verdade é aquilo a que também chamamos o ser. Verdadeiro é o que é. Mas o que é, é ilusão. Por isso é verdade é a ilusão, é uma ilusão » (Textos Filosóficos)

Esta crença é vulgar num momento histórico em que os homens começam a compreender a fragilidade de ideologias éticas e morais. Fernando Pessoa é mais um nome a dar forma ao vazio e à instabilidade das consciências abaladas. É igual a voz de Pirandello, homem do mesmo momento histórico:

“… se tornar a pensar em todas aquelas ilusões que, agora, já não lhe « parecem » o que éeram » naquele tempo para si, não sente faltar-lhe já não digo estas tábuas do palco – mas o próprio chão debaixo dos pés? E não chegará à conclusão de que, da mesma maneira, toda a sua realidade de hoje, tal como é, está condenada a parecer-lhe ilusão amanhã ? » (Luigi Pirandello, Seis personagens em busca de autor)

A facilidade com que sobre isto pensa e com que se entrega ao fingimento de estados de alma, pretendendo que todos são reais, é um derivativo da sua convicção no engano, e portanto, da descrença na estabilidade do ser e do pensar. Como corolário da tese da ilusão, as imagens cénicas do poeta : reduz o mundo ao espaço de um palco onde nos vamos exibindo e onde cada um de nós é o fantoche de si próprio.

« La vérité sur la scène, c’est tout ce en quoi l’acteur peut croire avec sincérité » (C. Stanislavsky, La formation de l’acteur) e se a verdade, na cena que Pessoa ergue ou vê erguida, é uma verdade feita de mimos, bobos, palhaços, saltimbancos e máscaras, é nessa que ele acredita e, consequentemente, terá de conceber o mundo com a falácia que o teatro empresta à vida. « A nossa vida é palco e confusão », é um conjunto desagregado e nem os deuses, nem a tradição têm a coesão que os homens lhe emprestam. Limitada ao espaço de um palco ou de uma feira ; limitada ao circo do correr dos dias, o homem desempenha um papel, no caso do poeta conscientemente, na generalidade sem conhecimento – o que o poeta desejaria !

« Somos todos palhaços estrangeiros », « actores de convenções e poses determinadas », na cinematografia em que nos encontramos empenhados « A vida é uma grande feira e tudo são barracas e saltimbancos » ; o nosso símbolo é uma última esperança e uma última ilusão que « Não significam nada / Mimos e bobos são ».

O jogo teatral não é só drama do exterior ou da vida dos outros. O poeta vive-o dentro de si. Confessa-o a desenrolar-se no quotidiano – « … tenho passado com razoável calma pela ilusão sucessiva dos dias” (CACR) – confessa-o a desnerolar-se no seu próprio coração – « Meu coração é um enorme estrado » – ou na sua alma a que falta sempre qualquer coisa como se se tratasse de « um palco deserto », sem personagens, sem movimento, sem princípio vital. Sustentado por ilusões, quando a representação acaba, finda como ela tudo o que foi sonho – e foi a vida toda…

A ilusão, que me mantinha,
Só no palco era rainha:
Despiu-se, e o reino acabou.
(Cancioneiro)

Pessoa e Campos « figuram as coisas e a vida, a própria existência e as sensações, pelas metáforas de comédia, tragédia, sendo elas todas manifestações de realidades aparentes e ilusórias que disfarçam a realidade absoluta do universo e da alma humana. O fingimento torna-se a pose habitual do homem, porque a capacidade de conhecer-se é restrita, se não fora de alcance. A alma, objectivo do conhecimento, traz camada sobre camada de máscaras inseparáveis. Só um homem excepcional como Fausto conseguiu largar uma vez todas as máscaras, viu o fundo da alma e ficou horrorizado pela verdade descoberta » (Rainer Hess, As metáforas cùenicas na obra de Fernando Pessoa) – « Bebi a taça … do pensamento / Até ao fim ; reconhecia-a pois / Vazia, e achei horror ».

[Maria da Glória Padrão, A Metáfora em Fernando Pessoa, 1981]

O Espaço ou a Solidão (8) pela Floresta dos Pavores


Outras palavras do domínio do espaço vão ser novamente expressão da abulia de Pessoa : floresta, deserto ou abismo são uma nova justificação de inactividade.

Estas imagens, se são comuns às imediatamente anteriores por não serem obsessivas, logo se diferenciam delas porque superlativiam e alargam o desconhecimento do poeta e trazem uma definição dos conceitos e das realidades constitutivos do mundo que o homem normalmente surpreende.

Mais uma vez as imagens em que o poeta se apoia o vão acusar (« … par notre premier choix, l’objet nous désigne plus que nous ne le désignos », Gaston Bachelard, La psychanalyse du feu). Definindo o universo como uma floresta – « … na vasta selva virgem / Do mundo inumerável” – revela-se-nos mergulhando numa realidade confusa com uma transcendência que escapa à sua penetração. Perante essa floresta que não é descrita,sente-se uma grandeza e uma profundidade escondidas, « on se sent devant une impression essentielle »(G. Bachelard, La poétique de l’espace). Pessoa sente a grandeza imprescrutável também, de um outro mundo da sua visão, ironicamente mais real que o nosso, mas igualmente desconhecido : « … uma floresta de escarnados braços / Inutilmente erguidos para o céu ». Na viagem da vida, « Viagem essa, meu querido Amigo, que é entre almas e estrelas, pela Floresta dos Pavores” (CACR) ele não sabe para que lado se virar no emaranhado de troncos e ramos.

Esta desorientação é a mesma do Pessoa colocado na aridez e inutilidade do deserto, sem bússola – nova definição da vida e do que ela contém:

Grandes são os desertos e tudo é deserto.
(…) Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes …
(Campos, 478)

A confusão da floresta e a falta de rumo no meio do deserto, continuam-se no abismo, símbolo, desta vez, um pouco obsidiante, local onde o poeta a todo o momento se despenha.

O abismo é tudo: céu e mar, vida e morte, alma e pensamento. Na « Mensagem », o céu abre o abismo para receber Vasco da Gama ; Do abismo que está debaixo do mar ergue-se a vontade mítica de Portugal. O poeta está situado num mundo abismal, porque desconhecido e todas as realidades materiais ou imateriais vão encontrar lugar nesse espaço tremendo e indefinido.

Unicamente no mundo de Caeiro não há acidentes orográficos que mereçam tal nome. Ele não tem filosofia; o seu pensamento nunca dá saltos em despenhadeiros ; é o igual da natureza que só guarda rebanhos.

Para Reis, o abismo é a alma e a morte. Para Campos, é toda a existância :

Perante esta única realidade terrível – a de haver uma realidade,
(…) Perante êste abismo de existir um abismo,
Êste abismo de a existência de tudo ser um abismo,
Ser um abismo por simplesmente ser,
Por poder ser,
Por haver ser!
(Campos, 515)

O destino do poeta aparece-lhe na alma como um precipício; todos somos irmãos gémeos de tudo por tudo ser abismo e a insondabilidade mantém-se ainda entre o que o poeta sonha e a realidade:

… êsse indistinto
Abismo entre o meu sonho e o meu porvir …
(Cancioneiro, 73.12)

O fosso porfundo já não é entre o fora e o dentro. É só lá dentro :

Paro à beira de mim e me debruço …
Abismo …
(Pessoa, 545.1.XVII)

Fundem-se os dos agora, interior e exterior no mesmo abraço de desconhecido e de tragédia:

E o mistério e horror do mundo
Silentemente recebo
No meu absimo profundo.
(pessoa, 545.1. XVIII)

Soa-nos a desgraça a voz do poeta e nem doutro modo podia soar. Desconhecido ele, num mundo desconhecido, tendo como lugar do fim o “Abismo onde não há mudança”, os gritos que lança para ser arrancado “do solo de angústia e de inutilidade / Onde vicejo” não fazem mais do que lançá-lo cada vez mais profundamente no abismo de si e da vida, no nada que é tudo.Na mistura de paradoxos que se seguem, Pessoa dá-nos conta de que o que realmente existe é esse nada que situa na floresta, no deserto ou no fosso do deconhecido:

“Nós sabíamos ali, por uma intuição que por certo não tinhamos, que êste dolorido mundo onde seríamos dois, se existia, era para além da linha externa onde as montanhas são hábitos de formas, e para além dessa não havia nada”, o nada para onde se abrem todas as portas “por onde vejo sempre a mesma escuridão” (Pessoa, 545.2.XVIII).

[Maria da Glória Padrão, A Metáfora em Fernando Pessoa, 1981]

Wednesday, March 11, 2009

L’Eglise catholique, la vie, le Brésil


L’on peut à bon droit avoir du mal à comprendre l’indignation quasi générale, soudaine, ponctuelle, qui a répondu à la nouvelle de l’excommunication de la mère brésilienne responsable de l’avortement de sa fillette de neuf ans, violée par son beau-père, de cette fillette qui a perdu deux jumeaux.

Ce n’est pas que l’indignation ne soit justifiée, elle l’est assurément mais elle est surprenante comme ponctuelle, comme exception d’un silence complice plus continu à l’endroit d’une Eglise catholique dont le moins que l’on puisse dire est qu’elle a coutume de «persévérer dans son être»…

Négationnisme et vichysme accueillis à bras ouverts il y a quelques semaines, prospérité nouvelle du créationnisme, affaire de Recife, tout communie, si j’ose dire, dans la confirmation de ce que l’Histoire a dit de l’Eglise catholique.

Et l’Histoire en a dit que sous couvert de défense et d’illustration du vivant et de l’amour du vivant, elle défend en réalité de l’Idée, de l’Idée de la vie, de l’imagination, de la poésie du vivant qui est un fantôme, un ange de vie mais qui est de l’ordre de la «vie morte».
L’Eglise catholique (son vaisseau amiral) goûte la mort de la vie et celle de la mort quand elle est de l’ordre de la vie. Ce n’est pas la vie que défend l’Eglise catholique mais l’imagination «toute romaine», l’idéation qu’elle en façonne. On peut aimer ou abhorrer cette idiotie (au sens grec, cette «fermeture à un savoir») mais on ne peut pas se tromper sur elle. Et quand on l’abhorre c’est continûment qu’il s’agit de s’indigner.

L’Eglise catholique défend depuis toujours une conception arrêtée de la vie (comme la flèche du sophiste qui nie le mouvement en passant de point fixe en point fixe) qui est la contradiction même de la vie comme mouvement, champ erratique de forces, comme errance tragique. Elle défend la vie morte, elle hait la vie vivante et sa gigue, elle promeut l’Eternel et vomit la mort qui est part de cette vie qu’elle vomit. On ne peut guère en attendre autre chose sauf à penser son non-être.

On ne pouvait attendre de l’Eglise catholique qu’une attitude, celle qui consistait à préférer la vie encore absente, la vie pas encore de la vie, la vie pas tout à fait vivante, la vie peut-être un peu morte, la vie problématiquement vie, celle des jumeaux, à la vie présente, de la vie, tout à fait vivante, assurément vie, de la petite fille qu’un accouchement eût condamnée. On ne pouvait en attendre autre chose, sauf à vouloir que l’Eglise fût autre chose que son être, un non-être de l’Eglise qui serait l’Eglise, ce qui est, au sens strict, impensable, c’est-à-dire non-pensable.

Il n’est pas étonnant que l’affaire soit brésilienne (et savoureux que l’excommunication soit justifiée par tel Cardinal dont la traduction littérale du nom est «Jean-Baptiste Roi», c’est-à-dire un nom convoquant la vision surréaliste d’une tête coupée portant couronne, d’une mort refoulée, d’un déni de cette vie qui est aussi faite de mort).

Il n’est pas étonnant que l’affaire soit brésilienne : quelle terre de mission plus excitante pour le catholicisme sous ses divers avatars également hostiles au vivant vivant, que ce pays de la vie radicale, de son beau désordre tragique, de son hasard glorieux, source d’allégresse et de mélancolie?

[Emmanuel Tugny, Libération]

Sunday, March 8, 2009

Alchimie des idées

Adriaen Vanostade, l' Alchimiste, 1611

« Les idées glissaient elles aussi. L’acte de penser l’intéressait maintenant plus que les douteux produits de la pensée elle-même. Il s’examinait pensant, comme il eût pu compter du doigt à son poignet les pulsations de l’artère radiale, ou sous ses côtes le va-et-vient de son souffle. Toute sa vie, il s’était ébahi de cette faculté qu’ont les idées de s’agglomérer froidement comme des cristaux en d’étranges figures vaines, de croître comme des tumeurs dévorant la chair qui les a conçues, ou encore d’assumer monstrueusement certains linéaments de la personne humaine, comme ces masses inertes dont accouchent certaines femmes, et qui ne sont en somme que de la matière qui rêve. Bon nombre des produits de l’esprit n’étaient eux aussi que de difformes veaux-de-lune. […]

Par instants, on tremblait comme sur le bord d’une transmutation : un peu d’or semblait naître dans le creuset de la cervelle humaine ; on n’aboutissait pourtant qu’à une équivalence ; comme dans ces expériences malhonnêtes par lesquelles les alchimistes de cour s’efforcent de prouver à leurs clients princiers qu’ils ont trouvé quelque chose, l’or au fond de la cornue n’était que celui d’un banal ducat ayant passé par toutes les mains, et qu’avant la cuisson le souffleur y avait mis. Les notions mouraient comme les hommes : il avait vu au cours d’un demi-siècle plusieurs générations d’idées tomber en poussière. […]

Le philosophe qui tentait de considérer dans son ensemble l’entendement humain voyait sous lui une masse soumise à des courbes calculables, striée de courants dont on eût pu dresser la carte, creusée de plis profonds par les poussées de l’air et la pesante inertie des eaux. Il en allait des figures assumées par l’esprit comme de ces grandes formes nées de l’eau indifférenciée qui s’assaillent ou se relaient à la surface du gouffre ; chaque concept s’affaissait finalement dans son propre contraire, comme deux houles qui se heurtent s’annihilent en une seule et même écume blanche. »

[Marguerite Yourcenar, L’œuvre au noir]

Saturday, March 7, 2009

La mesure de l'amour

Tristan et Yseut

La seule mesure de l’amour, disait Augustin, est d’aimer sans mesure; mieux encore: c’est l’absence de mesure qui est elle-même la mesure. Appliqué à l’amour … il faut dire plutôt : jamais assez, jamais trop ! toujours davantage ! … le mot excès n’a pas de sens quand il s’agit d’aimer : comme l’amour, l’impératif moral déborde indéfiniment de sa littéralité actuelle. La démesure ne saurait donc faire l’objet d’un interdit quand il s’agit d’amour. Et c’est pourquoi la phobie d’un amour « immodéré » implique déjà une restriction injurieuse, une lésinerie dérisoire, une espèce de sordidité épicière.

A partir du moment où l’amour doit être dosé, il n’est plus un impératif anhypothétique, mais une prescription conditionnelle ; il n’est plus la loi morale, mais, comme les médicaments prescrits par ordonnance, il dépend de sa posologie. En matière d’amour la question « combien de gouttes » n’a pas de sens, et les précisions quantitatives en général sont tout à fait oiseuses. (…) Les mots fatigue, excès, outrance ici n’ont plus cours : l’amour les abandonne à la timidité petite-bourgeoise ; il n’a pas peur, lui de dépasser la mesure ni de franchir une limite : la limite recule au fur et à mesure devant son élan. L’impetus amoureux ne veut rien savoir du régulateur qui, à l’occasion, compenserait ses débordements ; sa seule loi est le crescendo, frénétique et l’accelerando, et le precipitando qui va jusqu’au vertige et risque finalement de tout faire sauter. […]

En quoi l’amour extrême est un amour délirant, … pourquoi cet amour aime, littéralement, à la folie : pourquoi on peut être vraiment fou d’amour ? … Parce que l’amour porte en lui-même sa propre négation ; l’amour, à l’extrême limite, se dément lui-même. Telle est la sublime absurdité du sacrifice, tel l’héroïque non-sens : le sacrifice nihilise tout problème, y compris celui-là même qui le pose ! Comme l’amour de Tristan pour Yseut et l’amour d’Yseut pour Tristan, la passion amoureuse est affirmative au point de désirer son propre néant. N’est-ce pas le comble et la fine pointe aiguë du paradoxe ? Car on peut mourir d’amour ! Car on peut aimer, à en mourir, c’est cette contradiction intestine qui est démentielle, voire même absurde, et, dans certains cas, sublime.

[Vladimir Jankélévitch, Le paradoxe de la morale]